Por Júlia Ramalho
Paixão por ajudar a transformar pessoas e organizações na sua
melhor versão.
Vejo oportunidades diante das incertezas.
Ainda
nem assimilamos direito o que é a sociedade digital e quais seus principais impactos
e já temos autores falando sobre “sociedade pós-digital”. Segundo essas
perspectivas, o pós-digital acontece quando não percebemos mais a tecnologia
digital como algo externo à sociedade. Ela é absolutamente essencial, onipresente,
e, como a energia elétrica, acaba por se tornar invisível (apresentei essa
relação de essencialidade num seminário da ONU em 2010, em Barcelona).
Clay
Shirky diz que uma revolução tecnológica não acontece quando utilizamos novas
ferramentas, mas sim quando adotamos novos comportamentos. O pós-digital funciona,
assim, como um jogo de palavras que marca o fato de que já estamos imersos no
mundo digital, ou seja, não estamos apenas recorrendo a novas ferramentas
tecnológicas, mas passamos a apresentar comportamentos diferentes em função delas.
Mas, “so what”? E daí? O que há de novo nessa conversa?
Vejamos.
Alguns autores discutem o pós-digital para pensar em formas mais efetivas de
marketing e comunicação. Outros, por sua vez, recorrem ao termo para refletir
sobre os efeitos do mundo digital sobre nós, seres humanos, que vivenciamos um
processo contínuo de geração e disponibilização de informação, conformando
aquilo que Alfons Cornellá nomeou como “infointoxicação” – sim, é isso mesmo,
uma intoxicação de informação.
Isso
ocorre porque estamos imersos num mundo informacional digital, em que tudo é
sutilmente disponibilizado para aquisição: ideias, modos de vida, aprendizagem.
Há um excesso de oferta para tudo isso, o que gera recursos cada vez mais
baratos ou, até mesmo, gratuitos. Além disso, no pós-digital não existem mais diferenças
entre mundo on-line e mundo off-line. Estamos tão intensamente on-line que não
sabemos mais o que é estar off-line de verdade.
Diante
desses dois aspectos, não sabemos mais distinguir nem mesmo o que é necessário
e o que é importante em nossas vidas. Seguimos distraídos do que somos e do que
queremos. Pensemos numa situação corriqueira como jantar fora. Para ir a um
restaurante, procuramos o endereço no celular (e muitas vezes consultamos
também suas avaliações on-line antes de fazermos nossa escolha). Ao chegarmos
ao local, mantemos o aparelho sobre a mesa para tiramos foto do prato que
escolhemos e dos amigos com os quais estamos. Sentimos que é preciso registrar
tudo para, posteriormente (ou mesmo imediatamente), compartilhar no mundo
on-line, nas redes sociais. E não paramos por aí: após o jantar, usamos o
celular para avaliar o restaurante, para pagar a conta e para chamar um carro
para ir embora. Se fazemos tudo isso on-line, será que realmente saímos de casa
para ter a experiência de um “jantar fora”? Por que simplesmente viver o
momento não é mais suficiente para nós?
AFINAL, O QUE IMPORTA É O QUE IMPORTA PARA VOCÊ!
A
sociedade pós-digital talvez venha nos trazer algo esquecido há tempos por
muitos de nós.
Se
viveremos tempos cada vez mais acelerados e de abundância (como aponta Peter
Diamandis), talvez o caminho para termos uma vida melhor seja nos perguntarmos
sobre nossos desejos e sobre as relações que estabelecemos com o mundo a partir
deles. O que é externo a nós apresentará tantas possibilidades, tantas ofertas
mágicas e dóceis, que para identificar o que realmente nos importa nessa
sociedade pós-digital teremos que estar atentos ao que nos conecta, às nossas
paixões e desejos. Somente as boas perguntas irão nos ajudar a refletir sobre
nosso norte. Se não o fizemos, corremos o risco de a comida esfriar, os olhos
não se cruzarem, as mãos não se tocarem, o sabor não ser sentido...
É nesse
sentido que minhas reflexões a respeito do mundo pós-digital se encaminham
hoje: para que ele, de fato, seja o pós,
o depois, o mais além do digital. Para
que, além de estarmos conectados de forma invisível, sejamos capazes de nos desligar
intencionalmente do mundo on-line e retornar às coisas básicas. Para pensarmos
na melhor maneira de responder às boas perguntas: de que vale o tempo por nós investido
nas redes sociais, para que precisamos disso? Por que fazer um trabalho sem sentido,
que não deixe nossa marca sobre o mundo e as pessoas que nele vivem? Para que
manter o ruído interminável do mundo on-line e desconsiderar as possibilidades
do seu silêncio? Por que tantas imagens compartilhadas com as pessoas e tão poucos
momentos de construção, inspiração e compartilhamento de sonhos com os amigos?
O
pós-digital nos convida, com urgência, a sentir, a ver, a ouvir e a nos conectarmos
com tudo aquilo que faz sentido para nossas aspirações, para nossas emoções. Acredito
que apenas desse modo não correremos o risco de ter tudo, de poder tudo e,
ainda assim, não viver nada.
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