COMO AS BIBLIOTECAS SOBREVIVERÃO ÀS TECNOLOGIAS


Um dos maiores riscos que os centros de leitura correm é o de acreditar que serão extintos

Carlos Teixeira
Jornalista, designer do Futuro
Editor do site Radar do Futuro

Ao passar diante da principal biblioteca pública de Belo Horizonte, a Estadual Luiz de Bessa, no circuito cultural da Praça da Liberdade, imagino como deve ser o futuro do lugar, no momento atual.
No mundo, as perspectivas dos centros de leitura são incertas, diante da evolução de tecnologias. Tanto as que possibilitam a leitura em recursos tablets e samartphones, quanto as que dão acesso a pesquisas e leituras em praticamente qualquer lugar do planeta. 

O maior risco que as bibliotecas podem correr nos próximos anos é que se expanda e consolide a crença de que elas perderão utilidade diante das projeções de morte do livro em papel e do avanço das publicações digitais. Particularmente em países de baixos investimentos em cultura, como o Brasil, onde os espaços dedicados aos livros são raros, os riscos tendem a ser maiores.

As discussões sobre o futuro das bibliotecas são frequentemente marcadas pelo tom nostálgico. Um quase conformismo. No site Slate, o escritor Jacob Brogan, especialista em tecnologia e cultura, diz que há um "tom premonitório, que inclui lamentos pela perspectiva de inclusão da atividade de gestão de publicações no catálogo de funções em extinção. Diante de tal conformismo, há, no exterior, e menos ainda no Brasil, poucos exercícios que tentem desvendar alternativas para o futuro.

Jacob Brogan ressalta a preocupação com a ausência de uma busca de alternativas, diante do viés pessimista das análises predominantes no mercado. É necessário buscar um meio-termo entre o conformismo diante de um fim próximo e as propostas com visão exclusivamente de adaptação à realidade futurística. "Quem imagina bibliotecas como espaços puramente digitais também erra o alvo", assinala.

Um relatório do instituto de pesquisa Pew Research Center reconhece que o fechamento de bibliotecas provavelmente afetaria a população de baixa renda. Pelo menos nos Estados Unidos, as bibliotecas públicas não são apenas destinos educacionais. Elas também fornecem acesso às oportunidades econômicas disponíveis. Imagine no Brasil, onde o corte de investimentos no setor público torna ainda mais trágico o acesso à educação.

De acordo com um estudo da União Internacional de Telecomunicações, de 2014, mais de 4 bilhões de pessoas ainda não têm acesso básico à internet. A entidade reconhece que algumas soluções apontadas como democratizantes para o acesso ao conhecimento, como o site Wikipedia. Há um acriticismo a combater no caminho. Para Jacob Brogan, embora alguns dos serviços digitais inovadores, como a enciclopédia colaborativa, possam reduzir o fosso do acesso ao conhecimento, também ameaçam impor novas formas de desigualdade. O rico fica com a internet plenta, enquanto os pobres ficam com o Wikipedia e o Facebook.

Serviços de acesso gratuito à internet, como os desenvolvidos pelo Google ou Facebook, em áreas remotas do planeta, podem criar ilusões também. " As bibliotecas também oferecem uma variedade de outros serviços e informações complementares. Inclusive a assistência aos visitantes para dar sentido à busca de informações. Sistemas de buscas e de compartilhamento tendem a ser encarados como suficientes no processo de comunicação e informação.

Em síntese, as bibliotecas também podem desempenhar um papel importante na evolução social e política. A Federação Internacional de Associações e Instituições Bibliotecárias defende este ponto de vista, quando propõe que as bibliotecas contribuem para a transparência do governo e a participação cívica. Pelo menos nos Estados Unidos onde, de acordo com o relatório Pew, a maioria dos adultos que usa instalações da biblioteca estava ativamente envolvida em suas comunidades.

Percepções similares também estão no foco da Fundação Bill e Melinda Gates, da Microsoft.  The Gates Fundação afirma que as bibliotecas podem oferecer Internet de formação, bem como o acesso simples. Ao fazer isso, a instituição propõe que essas instituições podem afetar tudo, desde saúde pública ao ativismo ambiental.
Reposicionamento

Mais que lamentar, gestores e profissionais de bibliotecas devem entender que o futuro passa pela definição de novas estratégias, incluindo os novos papeis sociais a desempenhar. Com tal objetivo, a fundação Gates financiou o trabalho de organizações como Rede Global, que constrói biblioteca e recursos em regiões rurais no Sul da Ásia. A biblioteca pública continua a ser um destino para muitos usuários, que serve a muitos propósitos.

As ameaças estão presentes, de fato. Além da possibilidade de os próprios gestores acreditarem que elas não têm futuro, há a contrapartida na crença de que a tecnologia pode tudo, que tudo estará disponível na rede.

Em mais algum pouco tempo, é possível acreditar em oportunidades a partir da descoberta de que o papel não morrerá com os livros. Em mais algum tempo, as pessoas começarão a entender que perderam parte de suas histórias de vida sob a crença de que a internet guarda tudo. Será, então, a oportunidade para as bibliotecas ganharem nova vida.

Comentários