Estresse e ansiedade no trabalho: uma tendência?

Por Júlia Ramalho
Paixão por ajudar a transformar pessoas e organizações na sua melhor versão, 
vejo oportunidades diante as incertezas.



Crise econômica, reforma trabalhista, aumento da taxa de desemprego, automação e robotização das tarefas, essas são algumas das preocupações que o indivíduo de hoje tem ao enfrentar o mercado de trabalho. Além da hiperconectividade que nos abastece de informação e lembretes a todo instante, ainda temos que estar atentos as mudanças e nos qualificarmos para as novas exigências das empresas.  Cada vez mais, há pessoas afastadas de seus trabalhos devido aos transtornos mentais e emocionais. Como lidar com estresse e ansiedade no trabalho? 

Segundo o Ministério da Previdência Social, nos últimos dez anos, a concessão de auxílio-doença acidentário devido a tais males aumentou em quase 20 vezes.Nove em cada dez brasileiros no mercado de trabalho apresentam sintomas de ansiedade, do grau mais leve ao incapacitante. E isso não é apenas um problema brasileiro, estimativas do Fórum Econômico Mundial indicam que os gastos relacionados a esses transtornos podem chegar a 6 trilhões de dólares até 2030.

Sabemos que essas doenças podem ter como causa diferentes fatores, mas não podemos negar que com o avanço da tecnologia nos tornamos cada vez mais ciborgues, organismo cibernético. Nesse sentido, estamos cada vez mais expandindo nossas capacidades de nos informar por meio de nossos smartphones. E isso, assim, em um estalo, ao alcance de nossos bolsos.

Essa necessidade, de estarmos cada vez mais acompanhando e sabendo de tudo, tem gerado o que alguns estudiosos estão chamando de FOMO (Fear of Missing Out), ou medo de ficar por fora. Sendo isso, um dos efeitos dos smartphones na nossa vida. Como ciborguesestamos vendo, ouvindo e acompanhando tudo que se passa on-linee não queremos ficar de fora!
Além dessa curiosidade escópica, de ver tudo, há também a possibilidade do trabalho nos acompanhar em todos os lugares e a qualquer hora.  O WhatsApp, e-mail ou alerta de um aplicativo de compromissos, facilitam nossas vidas, mas também trazem algumas consequências negativas, como não saber a hora de parar de trabalhar. Sem contar que essas tecnologias vêm modificado o mercado de trabalho de tal forma que a grande maioria dos profissionais estão perdidos em relação ao rumo de suas carreiras (você pode saber mais sobre esse futuro do trabalho em diversos posts aquino blog.) 

A falta de habilidade em lidar com tudo isso, aliado a questões de entrega de resultados e prazos, pode levar ao estresse e ao aumento dos distúrbios de ansiedade e humor. Uma pesquisa realizada com 16 mil pessoas pela Regus, especializada em escritórios flexíveis, revela que mais da metade aponta o trabalho como a causa de estarem nervosos, irritados, cansados, tristes ou sem energia. O que não é para menos: se trabalhamos oficialmente oito horas por dia, mas não interrompemos nosso fluxo de trabalho, podendo assim chegar a dezesseis horas, como não ficarmos ansiosos? O lado que não prevemos é que profissionais com essas dores são sinônimos de queda de produtividade, perda de oportunidade, erros, atrasos nas entregas e acidentes de trabalho. O que causa aumento de custos, rotatividade de funcionários, e diminuição da qualidade do serviço/produto.

Como as empresas estão lidando com essa realidade?

A questão é séria e merece uma atenção maior, mas grande parte das empresas não estão dando ao problema a devida atenção que merece. A consultoria Merceravaliou 267 médias e grandes companhias e concluiu que 46% não planejam investir em um programa de saúde mental nos próximos anos. Apenas 18% mantêm algo nesse sentido, sendo que 54% oferecem exclusivamente palestras sobre o tema. Somente 5% contam com um psicólogo nas suas dependências. Ou seja, a saúde mental do trabalhador ainda é tema negligenciado em muitas empresas. Mas será que a inteligência artificial aplicada em assistentes virtuais de trabalho irá negligenciar essas questões?

Se robôs vão realizar nossas funções nas empresas nossa ansiedade aumenta ou diminui?

Acredito que esses problemas relacionados a saúde podem aumentar no futuro com as mudanças que o mercado de trabalho vem passado e ainda passará, com a robotização e automação de muitas das funções realizadas pelo homem. Já comentei anteriormente sobre estudos que apontam que muitos trabalhadores poderão ficar sem emprego. A falta do que fazer ou de um propósito para acordar todos os dias pode aumentar o número de pessoas com estes transtornos. Por outro lado, robôs monitorando o humor dos trabalhadores deve gerar o quê?


Como lidar com estresse e ansiedade no trabalho? 

Esta é a resposta de um milhão de dólares. Já sabemos que não existe resposta pronta para problemas de causas complexas, ainda mais quando estamos lidando com o que é absurdamente humano. Freud fez uma distinção de medo, ansiedade e angústia. Onde no primeiro tínhamos o objeto claro (medo de...), no segundo o objeto de certa forma se dissolve e aparece como algo do campo da expectativa (de que algo aconteça...) e na angústia tudo se torna inespecífico, daí o pânico e as somatizações. O que aprendemos com Freud é que nos três casos precisamos reestabelecer nossa relação com o desejo. Mais além do que precisamos fazer, precisamos saber o que nos conecta. Ficar conectado a tudo não nos permite saber o que é o desejo. Apenas é uma resposta a demanda do outro (dos outros) ou uma tentativa de se fazer presente ao olhar do outro. Nesse sentido, as mensagens e a redes sociais te controlam ao invés de você fazer um bom uso delas. Em vez de ser sujeito, você se coloca como objeto do outro na rede. Complexo, não é? Comece se perguntado ‘o que você quer saber’ e ‘o que precisa saber’ antes de simplesmente acompanhar todo o fluxo das redes.

Do ponto de vista das empresas, elas devem ampliar suas ações de bem-estar e saúde, desenvolvendo uma cultura corporativa que englobe a saúde emocional. Quanto mais as pessoas forem realmente respeitadas, mais o tempo de cada um também será tema de respeito. Em um seminário de ética, ao falarmos de respeito, um diretor me perguntou se era antiético enviar uma mensagem para um funcionário às 20h30 para saber do dia trabalho, uma vez que ele estava fora do escritório. Fizemos um exercício de pensar qual era a urgência da informação e o que o funcionário estaria fazendo neste horário. O diretor, envergonhado, disse que era desrespeitoso e que não devia ter a responsabilidade de tirar o funcionário do momento com sua família. A informação e a responsabilização são o caminho para diminuir os tabus e aumentar a prevenção em relação as doenças e transtornos. Estas podem ser causadas pelas relações antiéticas e desrespeitosas, também, por funcionários que não sabem o seu propósito e ou o que querem. Somente com gestores mais éticos e responsáveis e com funcionários com propósito claro é que poderemos ter um ambiente mais saudável e produtivo, distante de abusos e ansiedades. 


Júlia Ramalhoreside em Belo Horizonte (Brasil) e ajuda pessoas e organizações a revelarem o seu melhor, ao clarear propósitos, ver possibilidades diante das incertezas e manter foco nas ações necessárias. Faz isso há mais de 18 anos por meio de atendimentos em coachinge clínicos. Possui formação como psicóloga, coach e administradora, sendo também mestra nessa última área. Desde 2005 vem investigando as novas tecnologias e seus impactos sobre o trabalho e as futuras gerações. Como gestora, dirige a Estação do Saber [www.estacaodosaber.com] e foi presidente fundadora da International Coach Federation – ChapterMinas. Coordenou projetos de discussão sobre as novas tecnologias (ETC_BH -2009 a 2013) e de transformação da nossa cultura e sociedade (Estação Pátio Savassi – 2005 a 2013). Atualmente se dedica à construção de uma metodologia de orientação de carreiras através de conhecimentos de coachingdesign thinkinge análise de forças tecnológicas como inteligência artificial, internet das coisas e realidade virtual, dentre outras. Coordena e participa do grupo designers do futuro,que tem por objetivo promover discussões 

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